quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Mães brasileiras com “filhos especiais” falam sobre a realidade de viver com este desafio no Japão

É interessante notar que há muitos relatos de casos de crianças brasileiras com autismo no Japão ou outros diagnósticos de dificuldades ou distúrbios de aprendizagem detectando uma necessidade especial.

Geralmente são as escolas as primeiras a apontar aos pais a necessidade de se fazer uma avaliação.

Alguns profissionais brasileiros da área da saúde chegam a questionar estes diagnósticos de escolas e clínicas japonesas, duvidando se realmente trata-se de um distúrbio individual ou uma dificuldade do sistema de lidar com crianças estrangeiras, coagidas por um sistema cultural novo, portadora de comportamentos natural e humanamente diferentes.

Bem, mas questionar estes diagnósticos não é o foco desta postagem. O fato é que realmente existem famílias que precisam cuidar de crianças portadoras de necessidades especiais morando no Japão e vamos aqui mostrar como elas convivem com este desafio e os apoios que possuem.

Com ajuda das famílias que fazem parte do grupo social do Facebook nomeado como “Mães de filhos especiais no Japão”, reunimos algumas informações e depoimentos sobre os beneficios do governo, a relação sociedade japonesa e criança especial, a diferença entre o tratamento das escolas japonesas e brasileiras e a solidariedade entre brasileiros. Acompanhe:

Existem benefícios do governo para crianças especiais no Japão?

Sim. Além dos benefícios financeiros para todas as famílias com filhos no Japão, existe um especial que se chama “Auxílio de bem-estar da criança com deficiência” (Shogaji Fukushi Teate).

É um auxílio para crianças portadoras de deficiência física ou psicológica e que necessita de cuidados especiais na vida diária. Há limite de renda anual e depende de uma avaliação diagnóstica da criança. O grau de deficiência deve ser mais severo para o recebimento deste benefício. O valor médio é de 14.000 ienes por mês.

Além dos benefícios financeiros, há também uma preocupação do governo em proporcionar terapias, suprindo as necessidades de estímulos para o seu desenvolvimento, é o que comentam as mães. Existem, por exemplo, muitas escolas ou clinica com tratamentos especiais onde elas são encaminhadas para receberem tratamento.

Como a sociedade japonesa convive com estas crianças?

Comparando com o Brasil, a sociedade japonesa está mais preparada para aceitar e receber estas pessoas na sociedade. Há uma infra estrutura melhor para ela conviver na cidade. Mas, em termos de oportunidade de trabalho, o Japão, assim como alguns outros países possui suas deficiências no sistema de inclusão.

Em relação aos pais, vivendo numa sociedade competitiva, esses têm muita resistência em aceitar que seus próprios filhos possuam alguma deficiência e não procuram ajuda. Tirá-lo da escola padrão para uma especial seria como extrair do filho uma oportunidade de evolução acadêmica, necessária para um progresso futuro na universidade e vida profissional. Portanto, a maioria prefere fechar os olhos e não aceitar as recomendações da escola.

Como as escolas japonesas lidam com estas crianças?

Quando a escola padrão percebe alguma dificuldade especial na criança ela sugere aos pais que a encaminhe para um centro de diagnósticos (Hoken Center).

Quando os pais aceitam e há um diagnóstico concluído, geralmente eles indicam mudar o aluno para uma escola especial, que possui recurso de estimulação necessária, porém é excludente, por isso os pais lastimam tanto.

Quando os pais não aceitam e permanecem com a criança na escola padrão, os professores, em geral, não têm muito recurso para lidar com ela, deixando-o à parte do grupo, sem estratégia de apoio individual, perpetuando o seu atraso.

Algumas escolas possuem as chamadas “salas especiais” que são aulas de reforço para crianças com algum atraso na aprendizagem devido à diversos fatores (inclusive as de adaptação cultural, como no caso de alunos estrangeiros). Neste caso, os professores, geralmente, são especialistas em educação especial. Mas isso não significa ter capacidade adequada e multidisciplinar para oferecer condições de desenvolvimento pleno destas crianças. É apenas um reforço acadêmico, com algumas estratégias individualizadas.

Como funcionam as escolas públicas japonesas para crianças especiais?

As Escolas de Educação Especial (Tokubetsu-Shien-gakko) são escolas para crianças com deficiência relativamente mais severa e visam oferecer uma educação mais adequada às necessidades educativas individuais de uma criança. Existem em todos os níveis de ensino obrigatórios, desde o jardim de infância.

Há casos de crianças que vão para estas escolas e depois conseguem retornar para a escola tradicional. Dependo do grau de dificuldade, do nível e tempo de tratamento e estimulação que esta criança recebeu em sua vida.

As escolas brasileiras estão preparadas para receber uma criança com necessidades especiais?

Existem diversas experiências entre as famílias brasileiras. Mas o que difere na qualidade de atendimento escolar é o grau de dificuldade da criança, pois, se ela precisa de profissionais de diversas especialidades (como fonoaudiólogo, psicólogo, etc.), as escolas apresentam mais dificuldade no acompanhamento desta criança, por não terem suporte de equipe multidisciplinar.

Há casos de professores brasileiros estudando cursos de especialização sobre inclusão e atendimento de crianças especiais para ajudar na atenção individualizada destes alunos. E são apoiados pelas instituições.

Mas também há relatos de mães que não encontram na escola brasileira capacidade, investimento ou interesse em ajudar estas famílias.

Como a comunidade brasileira se solidariza e apoia estas crianças?

Existem associações de pais com crianças especiais no Japão, que vem se fortalecendo nos últimos anos, com apoio de profissionais especializados brasileiros e japoneses que oferecem palestras e orientações.

Existe também o grupo social no Facebook chamado de “Mães de filhos especiais no Japão”. Lá é possível tirar mais dúvidas e discutir as experiências pessoais com outras famílias que passam pelos mesmos desafios.

Conclusão

Para encerrar gostaria de levar-nos a pensar que todas as pessoas são especiais, possuem suas características próprias e tem o direito de conviver em sociedade. Todo governo, liderança e comunidade deveriam encontrar estratégias para que todas as pessoas se sentissem confortáveis no lugar onde vive e encontrassem oportunidades de aprendizagem.

Creio, juntamente como muitos estudos da ciência, que não existem dificuldades de aprendizagem e sim dificuldade de ensinagem. São os pais, professores, colegas e cidadãos que devem desenvolver novas formas de agir e ensinar estas crianças que sim, são repletas de potencial.

Agradeço às mães que disponibilizaram algumas informações e espero que as associações se fortaleçam cada vez mais para buscarem seus direitos e melhores oportunidades para seus filhos, em qualquer lugar deste mundo!

Rachel Matos 28/9/2015 via IPC digital
http://www.ipcdigital.com/colunistas/rachel-matos/maes-brasileiras-com-filhos-especiais-falam-sobre-a-realidade-de-viver-com-este-desafio-no-japao/


Resultados das minha pesquisa da pós graduação: 32 atitudes dos pais que ajudaram os filhos estrangeiros na escola japonesa

Quero, hoje, contar-lhes sobre uma pesquisa recente e fresquinha que eu acabei de finalizar com a Universidade Católica de Brasília (com polo em Tóquio) para conclusão da Pós-Graduação em Psicopedagogia. No final do texto, seria muito importante se você pudesse interagir conosco.

Há muitos anos, temos notado (eu e outros pesquisadores no país) que grande parte das famílias brasileiras se preocupam com os desafios de colocar seus filhos nas escolas japonesas.

Junto com este dado, observamos que, de fato, há um grande número de evasão escolar, basicamente por dois motivos: dificuldades de adaptação do aluno brasileiro no sistema japonês e dificuldades dos próprios pais em ajudar seus filhos.

Por conta desta evasão temos no Japão o maior número de casos de delinquência juvenil de brasileiros no exterior.

Além disso, detectamos que os jovens que abandonam os estudos ficam fadados às oportunidades marginalizadas do país.

Preocupada com este quadro e com desejo de ajudar os pais no Japão, elaboramos uma pesquisa que pudesse indicar quais as competências (conhecimentos, habilidades e estratégias) que pais deveriam ter para ajudar no processo de adaptação e rendimento nos primeiros anos escolares dos filhos neste país.

Para isso fizemos um longo e dedicado estudo, seguido de algumas entrevistas.

5 mães, 5 alunos do Chugakko (antigo ginásio) e 5 profissionais (entre eles psicólogas, psicopedagoga, tradutores e professores) participaram desta pesquisa acadêmica.

O resultado foi sensacional!

Descobrimos uma lista de 32 atitudes que os pais desenvolveram que ajudaram na adaptação e rendimento escolar de seus filhos. Estes dados sugeriram uma “competência paterna” que os estrangeiros precisariam ter para ajudar seus filhos nas escolas japonesas.

Estas atitudes representam a soma de 5 conhecimentos aprendidos, 14 habilidades desenvolvidas e 13 estratégias realizadas.

Confira quais são eles:

5 conhecimentos

Saber o idioma japonês: fala, leitura e escrita;
Conhecer as características e necessidades de cada faixa etária e série escolar;
Conhecer o Sistema Educacional Japonês: seu funcionamento, as regras, os objetivos, os conteúdos.
Conhecer a cultura japonesa;
Entender a realidade e o universo infantil japonês. Quais desenhos, brincadeiras, músicas, histórias preferidas as crianças japonesas gostam? Que tipo de vestimenta elas usam? Como elas se comportam?

14 habilidades

Ajudar nas lições de casa;
Ler todas as correspondências enviadas pela escola;
Trocar informações constantemente com a escola;
Respeitar as regras da escola;
Se relacionar com os pais dos colegas;
Trocar experiências com outros pais estrangeiros;
Incentivar e apoiar os filhos frente aos desafios, acreditando em seu potencial de superação;
Incentivar a apoiar os filhos na realização do reforço escolar, se for preciso;
Incentivar a apoiar os filhos a fazer amizades com crianças japonesas;
Dialogar constantemente com os filhos, estreitando a relação diariamente;
Estar atento ao rendimento escolar do filho, bem como as mudanças emocionais.
Não pressionar a criança. Respeite o seu tempo de aprendizagem e adaptação;
Cultivar uma cultura de estudos em casa, estimulando o filho nas aprendizagens;
Adaptar os estudos do filho de acordo com as suas necessidades individuais;

13 estratégias

Matricular o filho em alguma escola de adaptação antes de entrar no Shougakko (ensino fundamental);
Matricular a criança em escolas de reforço do idioma japonês depois da entrada na escola, se necessário;
Organizar a jornada de trabalho dos pais, de forma com que ao menos um familiar consiga ter mais tempo com o filho estudante, ajudando-o nas lições de casa e participando de eventos escolares;
Estar presente em todos os eventos escolares possíveis;
Buscar auxilio de profissionais intérpretes ou tradutores voluntários ou particulares, se os pais não dominam o idioma japonês;
Assistir a programas de televisão, filmes e desenhos japoneses em família, garantindo a familiaridade com a cultura, os assuntos e o idioma do país;
Promover atividades de relaxamento e descanso diários ou semanais;
Complementar as tarefas escolares em casa com atividades com o mesmo objetivo em português, se esta for a língua que a criança se sente mais confortável;
Buscar junto à comunidade escolar (professores, diretores, pais de alunos) alternativas de apoio ao filho, num trabalho feito em parceria;
Apresentar a cultura e hábitos brasileiros à escola, em momentos oportunos;
Fazer um planejamento financeiro;
Procurar auxílio de ONGs, prefeituras ou órgão governamentais do Brasil no Japão para receber suporte psicológico ou educacional de graça.
Adaptar a vestimenta e o corte de cabelo dos filhos para um estilo mais parecido com as crianças japoneses, se esta for uma necessidade e desejo deles.
Esta pesquisa foi tão interessante que finaliza na sugestão da elaboração de uma série de publicações que explique o passo-a-passo de alguns destes itens, com ajuda de diversos profissionais especializados no país.

Nos parece que seria interessante e relavante para a comunidade brasileira no Japão, não? O que você acha? Sugere temas? Deixe-nos sua opinião e sugestões!

Rachel Matos 07/9/2015 via IPC Digital
http://www.ipcdigital.com/colunistas/rachel-matos/pesquisa-revela-32-atitudes-dos-pais-que-ajudaram-os-filhos-estrangeiros-na-escola-japonesa-queremos-sua-opiniao/

Pais abrem o coração: “Escolhemos o futuro deles, será que estamos fazendo o certo?”

Muitas vezes escutei este questionamento feito por pais que saem do seu país de origem em busca de uma segurança financeira no exterior, mas carregam consigo culpas e angústias por levar seus filhos, impondo-lhes os desafios de se adaptar num “mundo novo”.

Alguns, então, preferem deixar as famílias na terra natal e enfrentar a jornada sozinho para não expor os filhos às dificuldades das mudanças de uma migração (especialmente se eles são mais velhos).

Certo ou errado? Não nos cabe julgar. As experiências, desejo e preparo pessoal de cada um levam as pessoas a tomarem suas decisões e as pessoas são livres para isso, é preciso respeita-las!

Mas é possível dialogar sobre esta profunda pergunta de quem carrega a família consigo numa migração, cuja resposta é também muito complexa.

“Nós escolhemos o futuro de nossos filhos quando os levamos para viver num país diferente, será que estamos fazendo o certo?”. Eis um possível caminho para ajudar as famílias chegarem na resposta:

Alivie sua culpa e o peso nas costas

Crianças não têm maturidade suficiente para decidir sobre seu futuro. Das dificuldades ou investimentos financeiros necessários para garantir uma melhor condição de vida para a família somente os adultos conhecem bem.

Quanto mais nova a criança for, menos ela sofre com os rompimentos dos vínculos afetivos (amigos e familiares). Portanto migrar com filhos na idade da primeira infância (0 aos 6 anos), costuma ser menos traumático e mais favorável para os processos de adaptação.

Agora, se as crianças forem maiores, já é necessário que os pais preparem o processo de desligamento, motivando e ajudando de forma mais ativa na adaptação no novo país.

Pais podem e devem fazer orientações, aconselhamentos e tomar decisões nas vidas de seus filhos. No entanto, esse poder diminui gradativamente à medida que eles vão crescendo e ganhando maturidade para tomar decisões e arcar com as consequências.

Há momentos e idades em que a criança mais velha ou o jovem podem ter mais dificuldade e resistência para aceitar novas experiências, fazer novos amigos, aprender outro idioma e aceitar novos sistemas sociais.

Se a decisão for migrar com toda a família, sendo os filhos mais velhos, não há culpa nisso, também, mas há mais responsabilidades e ações familiares necessárias.

Responda você mesmo com ajuda destas novas questões

A resposta à pergunta “Fizemos o certo ao escolher o futuro de nossos filhos?” depende de como os pais respondem à eles mesmos a estas questões:

– Preparamos nossos filhos para enfrentar desafios novos?

– Motivamos as crianças para aprender novas experiências?

– Compartilhamos com nossos filhos nossos sonhos de futuro, fazendo todos participar de uma missão em família?

– Conseguimos ouvir e respeitar os sentimentos (dores e prazeres) das crianças, acolhendo-os e animando-os na jornada?

– Garantimos estratégias de apoio aos filhos para se adaptar bem na escola e na sociedade?

– Conseguimos ter presença de qualidade e momentos familiares prazerosos nos momentos de folga, dando sentido à união e missão familiar?

A decisão pode ser correta, mas o modo com que se planeja a migração e gerencia a vida no exterior com filhos pode não ser favorável 

É claro que os pais sempre tentam fazer o melhor para os filhos, por isso estão isentos de culpa, mas às vezes têm dificuldades em perceber que as crianças e adolescentes também precisam de preparo para uma mudança e apoio nos processo de adaptação e aprendizagem num novo país.

Estas perguntas podem servir de reflexão para que as famílias migrantes pensem sua realidade e promovam ações que colaborem com os filhos.

Fazer o certo não depende da decisão de migrar com os filhos, tomando a decisão por eles. Fazer o certo depende de como as famílias se responsabilizam pelos seus processos de aprendizagem e amadurecimento deles.

Para os que se preocupam, aliviem a culpa e aprimorem os instintos protetores! Tudo tende a dar certo com seu amor incondicional!

Rachel Matos 31/8/2015 via IPC Digital
http://www.ipcdigital.com/colunistas/rachel-matos/pais-abrem-o-coracao-escolhemos-o-futuro-deles-sera-que-estamos-fazendo-o-certo/